Lucia reagiu no exato momento em que o perigo se insinuou. O corpo dela se moveu antes da mente, um reflexo instintivo, como se o medo tivesse sido substituído por puro impulso. Ela se lan?ou para frente, deslizando sob a sombra imponente do lobo, o cora??o trovejando nos ouvidos. Os dedos brilharam com mana instável, e ent?o, com um único pensamento, uma lufada violenta de vento explodiu na dire??o de onde a flecha viera.
Terra e folhas voaram em um turbilh?o caótico na tentativa de ocultar a vis?o do atacante. A poeira subiu, fragmentos de floresta se ergueram, e por um breve segundo, parecia que funcionaria.
Mas n?o funcionou.
O ataque n?o cessou. Nenhum ruído de surpresa ecoou entre as árvores. Nenhum inimigo revelado trope?ou ou se denunciou. Tudo permaneceu na mesma tens?o imóvel e opressora, como se o próprio ar estivesse preso em um limbo de antecipa??o.
Ent?o, tudo aconteceu rápido demais.
Eva agarrou seu pulso, sem hesita??o, sem espa?o para perguntas. O pux?o foi brusco, impiedoso, e Lucia caiu na terra úmida, sentindo o impacto reverberar até os ossos. O ch?o era frio, mas o panico era quente, pulsante, inc?modo. O segundo silvo cortou o ar.
Algo passou rente demais.
Ela n?o viu. N?o havia tempo para isso. Mas sentiu.
O zunido sibilou contra sua pele, uma lamina de morte tangível, um instante ínfimo entre viver e ser reduzida a uma carca?a sem nome. O mundo se contraiu para um segundo. Um milésimo de atraso, e sua cabe?a estaria no ch?o.
Lucia arfou, os pulm?es lutando para acompanhar o choque. O olhar correu pelo ambiente, costurando possibilidades, enxergando o que antes era apenas um borr?o. Seus olhos fixaram a flecha cravada na casca rugosa da árvore próxima, e a luz dan?ou sobre algo quase invisível.
— Isso é um... fio? — a pergunta escapou, trêmula, arranhando a garganta.
Lá estava ele — t?o fino que parecia um truque da mente — mas ele estava lá. Estendido a partir da flecha, como uma teia de aranha esperando para ser tocada.
— Parece que sim — murmurou Garm, sua voz baixa, mas carregada de uma compreens?o sombria.
O lobo ergueu a flecha que acabara de arrancar do próprio corpo, revelando o mesmo fio fino e trai?oeiro atado a ela. O sangue pingou da madeira quebrada, escorrendo pela linha, como se tentasse revelar o perigo oculto. Ele passou a língua no pequeno corte em seus lábios, que fez sem sequer perceber, e apesar de aparentar estar indiferente à dor, seus olhos brilharam em entendimento.
— S?o extremamente afiados. Tomem cuidado.
Eva abriu a boca, mas o instinto a impediu de falar. O som. Ela o ouviu antes que qualquer um processasse. O ranger tenso da madeira se dobrando sob tens?o. O arco retesado mais uma vez.
O som de um novo ataque, tinha certeza. Afinal, conhecia arcos melhor do que conhecia rostos.
Seu corpo reagiu. O bra?o se ergueu no exato momento em que a flecha foi disparada. O impacto contra sua manopla que cobria seu bra?o fez seus ossos vibrarem, um choque intenso que percorreu seus tend?es, mas o projétil foi desviado por centímetros.
Por muito, muito pouco.
— Lucia, tira o Garm daqui! Essa flecha também tem um fio! Vamos ficar presos!
— Você vem junto, idiota! — a resposta veio antes que ela pudesse pensar.
Lucia hesitou. N?o deveria ter hesitado. Mas o fez.
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A m?o brilhou novamente, mana borbulhando sem forma, sem dire??o. Um reflexo de sua incerteza. Seus olhos oscilaram entre Garm e Eva. O lobo ferido, e algo dentro dela sussurrou que queria a jovem ao seu lado.
— N?o discutam à toa. N?o vai ser t?o fácil fugir — rosnou Garm, sua voz carregada de um peso que ninguém quis encarar.
Seus sentidos estavam em alerta total. As orelhas erguidas, o olhar fixo em nada e tudo ao mesmo tempo. Pela primeira vez em muito tempo, ele n?o confiava em sua vis?o. Ele escutava.
E ent?o, se moveu.
Um salto brutal, selvagem, sua forma massiva colidindo contra as garotas. O impacto as jogou para trás, o ar sendo arrancado de seus pulm?es. Antes que pudessem compreender o que estava acontecendo, três flechas perfuraram o espa?o onde estiveram um segundo antes.
O ch?o tremeu.
— N?o é só um — Garm rosnou, os olhos sombrios como a própria noite.
— Eles sabem onde estamos — murmurou Eva, os olhos percorrendo os fios invisíveis que agora as separavam do lobo negro. Sua mente já mapeava a única op??o que tinham. — Garm, vai para o sul. Dá a volta e tenta nos encontrar na dire??o oposta de onde as flechas vieram. Nós vamos correndo para lá. Temos que fugir.
— Isso vai nos afastar da cidade — o lobo respondeu, a voz firme, mas tingida com um resquício de hesita??o.
— N?o temos op??o. Desvie!
Outro disparo. Outra flecha cortando o ar como uma lamina faminta, seguida por uma rajada de flechas que foram certeiras em sua inten??o — separá-los. Eva n?o esperou o impacto. Com um aceno breve, um entendimento silencioso, os antigos conselheiros de Insídia tomaram caminhos opostos.
Garm foi o primeiro a desaparecer, sua silhueta escura se dissolvendo na floresta como um espectro. O som de suas patas sumiu t?o rápido quanto surgiu, e de repente, o mundo se tornou menor. Mais vazio.
Lucia percebeu tarde demais que estava prendendo a respira??o.
Eva se moveu sem perder tempo, pegando o arco pela al?a e, mais uma vez, segurando Lucia pelo pulso. Um hábito surgido da necessidade. Como se temesse que a garota ficasse para trás. Como se soubesse que, se lhe desse tempo para pensar, ela poderia congelar.
— N?o para — ordenou.
Lucia n?o respondeu. Mas se deixou levar, correu.
A garota sentiu o peso da realidade esmagando sua coluna. O medo, a dúvida, o reconhecimento cruel de que ela n?o sabia o que fazer nesse tipo de situa??o. Seus dedos se apertaram em torno do cabo da espada, seus nós dos dedos embranquecendo.
Estava se sentindo pequena, se sentindo inútil. Quando foi a última vez que se sentiu assim? Ou melhor, já havia experimentado isso alguma vez?
N?o importava. Simplesmente odiou ser um estorvo. O barulho das folhas sob seus pés se misturava ao de sua própria respira??o acelerada. O medo ainda colava em sua pele, mas algo nele já estava se transformando em outra coisa. Em determina??o.
Eva sentia isso. Sentia a tens?o no corpo da garota, mas também via algo em seu olhar. Uma centelha de resigna??o, a resigna??o com si mesma que faz uma pessoa ir além do que pode. Era incerta, mas presente.
Lucia, por outro lado, via algo diferente na arqueira ruiva. Cansa?o. Mas n?o o tipo que pesa nas pernas, e sim o tipo que pesa nos ossos, no espírito. Uma decis?o silenciosa, um caminho sem volta já escolhido muito antes desse momento.
N?o havia espa?o para palavras entre elas. Sem Garm ali, o silêncio se tornava algo tangível. O clima era estranho, inc?modo, como se ambas estivessem sentindo a falta do lobo negro mais do que admitiriam. Como se, de alguma forma, sua presen?a tivesse sido um fio invisível ligando as duas.
Agora, sozinhas, apenas seguiram em frente.
Cobertas de terra e sangue, sem tempo para pensar, sem tempo para sentir.
Porque sabiam.
Isso era só o come?o.
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Ficaremos sem imagens por um tempo, mas logo volto a postar!
Estou meio sem tempo e n?o est?o saindo resultados bons...